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Educação Ambiental 33 anos depois do Tratado: há espaço para a formação do pensamento crítico?

Neste ano de 2025, a Rio 92 completa 33 anos. A Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, conhecida também como ECO- 92 ou Cúpula da Terra
Fonte: Artigo de opinião da Profª. Me. Edileuza Alves da Silva      06/03/2025

Por Profa. Edileuza Alves Silva

Neste ano de 2025, a Rio 92 completa 33 anos. A Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, conhecida também como ECO- 92 ou Cúpula da Terra, que reuniu 108 chefes de Estado de países-membros da ONU foi considerada a maior conferência ambiental já realizada.

O objetivo do evento foi debater o cenário ambiental global e o desenvolvimento sustentável, conceito que já vinha sendo proposto pela ONU desde 1972, porém sem conseguir ser expandido.

O resultado concreto da conferência foram cinco documentos aprovados: A) Convenção sobre Diversidade Biológica; B) Convenção Quadro sobre Mudança de Clima; C) Declaração do Rio de Janeiro sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento; D) Declaração sobre Conservação e Uso Sustentável de todos os tipos de Florestas; E) Agenda 21. A finalidade destes era tornarem-se instrumentos de referência para políticas, programas, projetos e medidas que governos, empresas e organizações da sociedade deveriam promover.

Durante a Rio 92, aconteceu uma conferência paralela de grande importância, a 1ª jornada internacional de educação ambiental organizada pela sociedade civil planetária, da qual resultou o Tratado de Educação Ambiental para Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade Global.

O documento internacional também foi considerado de extrema importância. Isso devido à sua consistência teórico-política, que reconheceu o poder da educação, enquanto geradora de processos permanentes de aprendizagem e estimuladora da formação de sociedades socialmente justas e ecologicamente equilibradas.  

Com o Tratado de EA a educação, a partir daquela data, passaria a ser compreendida conceitualmente como educação para sociedades sustentáveis, tendo como princípios a formação de um pensamento crítico, coletivo e solidário, de interdisciplinaridade, de multiplicidade e diversidade.

Inspirado nessa construção e ao mesmo tempo buscando cumprir o acordo internacional, o Brasil instituiu em 1999, a sua Política Nacional de Educação Ambiental- PNEA (Lei nº 9.795/99), tendo como base legal a Constituição de 1988, que determina que o Poder Público promova a educação ambiental em todos os níveis de ensino.  O que significou que a promoção da educação ambiental, a partir daquele momento, tornava-se obrigação da união, dos estados e dos municípios.

Entretanto, passadas três décadas do Tratado de EA e 26 anos da PNEA, a realidade brasileira continua piorando, em relação ao contexto em que tais instrumentos foram instituídos.

Estabelecendo relação entre as intenções e as ações, com base em uma diretriz do tratado de EA, que se compromete a “estimular posturas individuais e coletivas, bem como políticas institucionais que revisem permanentemente a coerência entre o que se diz e o que se faz”, identifica-se uma distância abismal. Isso contradiz a confiança atribuída à educação formal. Situando a esta educação no âmbito das secretarias estaduais e municipais, que são responsáveis pela educação básica, é pertinente se questionar: Será que estas têm mesmo tanto poder? Se têm, que lugar a educação ambiental (nessa perspectiva) ocupou e ocupa dentro delas?

Considerando o papel das mesmas na formação das pessoas e no mesmo nível de importância, os efeitos da crise climática em curso, fizemos uma busca nas redes sociais das secretarias municipais dos 20 municípios do Território de Identidade de Irecê, procurando identificar se o principal problema global do século XXI (aquecimento global) encontrava-se como prioridade nos conteúdos das jornadas pedagógicas. A jornada pedagógica é entendida aqui, como um momento de planejamento do ano letivo onde são organizados pedagogicamente os conhecimentos a serem ensinados e aprendidos. .

Embora o levantamento da informação seja imprescindível em todo o território nacional, fizemos a opção pelas secretarias municipais do TII, devido a esta região se encontrar em graves condições específicas: mais de 90% de sua vegetação nativa (a caatinga) destruída e outra parte em destruição; parte significativa do território em processo de desertificação; presença de grandes projetos de empresas de mineração, eólica e solar; uso indiscriminado de agrotóxico e baixo índice pluviométrico, ou seja pouca quantidade de chuva, o que compromete a safra 2025 implicando seriamente na segurança alimentar e nutricional. Segundo alguns guardões de tradições, este ano se assemelha ao de 1932, marco de uma seca que causou grande prejuízo à humanidade do Nordeste.

O resultado da busca foi surpreendente. Entre a programação das jornadas pedagógicas deste ano, nenhuma incluiu a crise climática. Uma pequena quantidade destas apresentou no título o termo sustentável ou sustentabilidade.  Porém, nem nas palestras principais e nem nas programações, a palavra ganhou centralidade. No geral, os eventos deram ênfase à gestão, avaliação, monitoramento, questões socioemocionais e inclusão.

Sabemos que para a formação de um pensamento crítico, coletivo e solidário, é necessário um projeto educativo de curto, médio e longo prazo. Sabemos também que para implementar a educação ambiental de forma  interdisciplinar, conforme preconizado nos documentos citados,  requer  poder e vontade política  e um processo de formação de educadores e educadoras  que seja fundamentado em consistentes bases teóricas e que seja pedagogicamente contextualizado na realidade em que estes e seus pares se encontram.   

 Ao abordar a Educação Ambiental nesse contexto, não se trata de fazer uma crítica unilateral. O que se propõe é uma reflexão acerca do potencial dos órgãos competentes pela formação de milhares de crianças e adolescentes neste território, em meio ao projeto ganancioso e voraz do capitalismo e ao mesmo tempo, a uma crise climática que compromete o futuro da vida no planeta. A educação nunca foi nem será neutra e também não é independente. As secretarias de educação estão e estarão subordinadas às determinações do poder econômico, que por sua vez( paradoxalmente) determina o poder político. Um exemplo emblemático disso, é a presença de mineradoras, eólicas e empresas do sistema S entre as parcerias de secretarias de educação, para a implementação de projetos nas escolas.

Nesse contexto, qual seria o espaço para a formação do pensamento crítico? Qual seria o espaço para a compreensão, análise e questionamento da realidade local, territorial e planetária? Talvez a indiferença à crise climática, cujos efeitos já adentram a escola e as casa de estudantes e educadores, não seja a manifestação da alienação nas secretarias de educação, talvez seja uma estratégia político pedagógica do capital, manifestada através da gestões municipais. Nessa perspectiva, os conceitos de sustentável e sustentabilidade são direcionados para o lado oposto. Ao invés de orientarem a busca do processo civilizatório da humanidade e o reconhecimento da função de suporte e de limite da natureza, conforme definição Leff(2004), eles são direcionados para a sustentabilidade do projeto do capital.

Profa. Edileuza Alves Silva: Mestra em Educação do Campo (UFRB) e ativista ambiental

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