Por Antônio Régie Figueiredo
São Gabriel é uma cidade jovem, mas com uma história marcada por lutas e desafios que ainda persistem. Sua trajetória remonta ao período colonial, quando o capitão-mor Antônio Guedes de Brito recebeu da Coroa Portuguesa um dos maiores latifúndios da época, abrangendo 160 léguas de terra entre Morro do Chapéu e o Rio das Velhas, em Minas Gerais. Essas terras foram concedidas como sesmarias remuneratórias, prática comum no processo de colonização e ocupação do sertão baiano.
Dentro desse contexto histórico, a Fazenda Barra de São Rafael, posteriormente conhecida como sobras da Fazenda São Rafael, tornou-se parte fundamental na formação do município. A propriedade, que pertencia ao Dr. José Alfredo Machado e sua esposa, Dona Anna Joaquina da Rocha Medrado Machado, foi negociada de forma cruel e desumana: trocada por um escravizado de 31 anos chamado Domingos Cabra. Esse episódio, além de evidenciar o sistema escravocrata que sustentou a economia local, também reforça a necessidade de refletirmos sobre como a história da cidade se entrelaça com as feridas do passado.
Inicialmente pertencente ao território de Xique-Xique e, depois, a Irecê, São Gabriel passou a ser vila em 1953. Mas a luta pela emancipação política só se intensificou nas décadas seguintes. Vereadores como Josué Durães, Raul das Virgens, Firmício Evaristo de Figueiredo e Osvaldo Ferreira dos Santos foram pioneiros nessa batalha, que ganhou ainda mais força nos anos 1980, culminando na conquista da autonomia municipal em 25 de fevereiro de 1985, com a promulgação da Lei nº 4.407.
Agora, 40 anos depois, São Gabriel tem motivos para comemorar, mas também precisa encarar com seriedade os desafios que ainda limitam seu desenvolvimento. A emancipação trouxe autonomia política e administrativa, mas será que essa independência se refletiu em avanços significativos para a população? Como estão a educação, a saúde, a infraestrutura e a geração de emprego na cidade? É fundamental que essa data não seja apenas um marco simbólico, mas um momento de reflexão sobre o que foi feito e, principalmente, sobre o que ainda precisa ser construído.
Mais do que recordar o passado, é preciso olhar para o futuro. A história de São Gabriel é rica e cheia de personagens que lutaram por um ideal. Agora, cabe às novas gerações dar continuidade a essa trajetória, buscando soluções inovadoras para os problemas que ainda persistem. Afinal, um município não se faz apenas com decretos e títulos, mas com planejamento, participação cidadã e investimentos reais no bem-estar de sua população.
São Gabriel completa 40 anos de emancipação, mas o que estamos fazendo para garantir que os próximos 40 anos sejam ainda melhores?
Antônio Régie Figueiredo: Prof. Língua Portuguesa, Escritor e Pesquisador de Culturas Populares